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segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Ao sugerir venda de ativos, presidente do TJ inclui a Caern


Cláudio Santos defende a reposição de recursos do Fundo da Previdência

Fonte: Tribuna do Norte 

O presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Cláudio Santos, apresenta uma sugestão para o governador Robinson Faria repor os recursos que foram sacados da Previdência Estadual: a venda de ativos do Estado, entre o quais empresas públicas — como a Caern (Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte) —, terrenos ou outros órgãos que poderiam ser privatizados. 
O fundamental, destaca o desembargador, é fazer essa reposição dos valores retirados, porque o governo do Estado, após os sucessivos saques, não pode deixar a Previdência sem os recursos. Cláudio Santos lembra que a preocupação com o assunto não é de hoje. Ainda no governo Rosalba Ciarlini ele tomou uma decisão judicial que impedia o saque antecipado para cobrir gastos com folha de pagamento dos servidores ativos ou aposentados. O dinheiro teria que ficar, como previsto originalmente, para pagamento de aposentadorias e pensões futuras. “A se permitir que os gestores do Estado usem esse valor financeiro (…) estar-se-ia compactuando com verdadeira malversação de recursos”, disse, na ocasião. Uma lei estadual, logo depois, aprovada na Assembleia, autorizou os saques para complementar o pagamento da folha de aposentados.

Nesta entrevista, o desembargador avalia como positivo o ano no Tribunal, um período de corte em gratificações e enfrentamento com sindicalistas . Ele considera que houve um arrefecimento do ambiente e conta com uma retomada do diálogo com o Sindicato. Mas continua enfático ao afirmar que é preciso mudanças na estrutura do Estado. Refere-se à necessidade de dificultar o acesso à Justiça para demandas que considera irrelevantes e poderiam ser resolvidas por policiais e órgãos como o Procon. E reconhece que é preciso mudar também a “cultura interna”.
Qual avaliação o senhor faz das atividades deste ano no Tribunal?
Foi um ano muito positivo. Desde o meu discurso destaquei a necessidade de fazer economia e respeitar o dinheiro público. Não e um desafio apenas o Judiciário do Rio Grande do Norte, mas o Poder Judiciário brasileiro. O Judiciário entrou neste discurso de que todos têm direito a tudo de graça, inclusive o acesso à Justiça. Isso terminou por formar uma cultura no sentido de que estamos à disposição para resolver tudo, inclusive questões pouco importantes. No mundo civilizado, vão para o juiz questões importantes. Mas venderam a ideia político-ideológica de que todo o povo tem acesso à Justiça e de forma muito aberta. Isso, lamentavelmente, não é possível. 

Por quê?
Essa demanda exagerada, insuflada por tal política, essa ideologia, é muito cara aos cofres do Estado, ao Poder Público e redunda em uma despeça que a população não tem condição de arcar com o pagamento dos tributos.

E o senhor conseguiu implantar medidas para efetivar uma tendência diferente desta “cultura”?

Pela minha pessoalidade, não. Eu sou integrante de um colegiado e tenho limites. Inclusive os próprios limites que são impostos pela estrutura. Mas meu objetivo, como está no meu discurso de posse, é mudar um pouco essa trajetória, essa tradição, de se buscar sempre mais dinheiro para o Judiciário para fazer mais, atender mais. Há uma busca muito grande por mais funcionários, mais juízes, mais serviços, mais fórum, por juízes leigos, por conciliação. Enfim, o Poder Judiciário no Brasil é exageradamente grande para as possibilidade e para um Estado moderno. Eu defendo um enxugamento do Judiciário brasileiro. Na relação custo benefício, todos os ramos do Judiciário estão se agigantando. Basta ver a Justiça eleitoral, trabalhista e estadual. A Justiça Estadual tem 80% das ações que tramitam no Brasil. Há um custo enorme por Estado. Tudo isso vai ser revisto, inevitavelmente, como foi em outros países, a exemplo de Portugal, Espanha, Grécia. Países que tiveram governos socialistas e reverteram. Fecharam tribunais, diminuíram a quantidade de juízes, que passaram a decidir questões importantes. 

Ainda cabe mais aperto, novos ajustes na Justiça do RN? 

Não falo em aperto, mas precisamos perseguir a observância da Lei de Responsabilidade Fiscal. A Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal dizem o que deve ser feito. Primeiro, o corte de gratificação, depois de cargo comissionado e até a exoneração de funcionários estáveis. Isso é o que está escrito na Lei de Responsabilidade Fiscal. Não inventei nada. Neste ano de 2015, não teve vencimento de funcionário que foi diminuído. Não posso diminuir vencimento em face do princípio de irredutibilidade de vencimento. Houve corte de gratificações,  que poderiam ser maiores, se fosse pela minha vontade, e de cargos comissionados. Tudo isso modificou um pouco nosso perfil. Como houve uma queda real da receita corrente liquida, não podemos, mesmo assim, diminuir tanto nosso posição acima do limite dos 6%. Isso parece que outros órgãos e poderes também estão acima. Estamos perseguindo a nossa adequação. Nos próximos tempos, se houver um crescimento do país, que não houve este ano, poderemos reinserir as despesas com pessoal, no limite de 6% que é estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal. 

Hoje está acima?
Não fechamos no último quadrimestre, que será no dia 31, No levantamento anterior, ficou em 6,4%. 

Mesmo com os ajustes?
A grande economia foi porque se pagou muita coisa administrativamente. Eu não estou criticando o passado, nem os gestores anteriores, mas fazendo um comparativo. Em 2015, gastamos R$ 105 milhões a menos do que em 2014. Eu considero que, quem tem dinheiro a receber do Tribunal de Justiça, tem que ir para precatório como todas as pessoas do Rio Grande do Norte. Não pode ter uma preferência e receber administrativamente. Então  todos têm que ser tratados igualmente. Notícia boa não faz alarde, mas voluntariamente não paguei PAE (Parcela Autônoma de Equivalência). Tive que pagar algumas recentes por decisão judicial. Então, os funcionários do Judiciário, como os dos Executivo, do Legislativo e dos demais poderes, têm que ser tratados da mesma forma e, se tem dinheiro a receber, ir para fila de precatório. Antes pagava diretamente quando a pessoa tinha o direito. Então, essa mudança de paradigma é o objetivo da administração a que me proponho. 

Nessa mudança de paradigma como se enquadra o auxílio moradia? 
O auxílio moradia é uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Eu acho o auxílio moradia, como está posto, imoral. Não concordo. Mas não  vou ser o único juiz do Brasil a não receber nem o único gestor a não pagar. Tem uma decisão do STF que determina o pagamento. Mesmo assim, pergunto-me como pode ter uma natureza indenizatória? O que indeniza? Qual o dano que repõe? O auxílio moradia acaba tendo outro caráter e como tal deveria ser incluído no subsídio e pago também aos aposentados, dado a paridade que existe entre os ativos e aposentados. Tenho este ponto de vista e espero que se encontre uma solução. Na última reunião do colegiado de presidentes dos Tribunais de Justiça, inclusive com a presença do ministro Ricardo Lewandowski [presidente do Supremo Tribunal Federal],  externei uma posição pessoal de que, como os magistrados brasileiros perderam até 35% dos adicional por tempo de serviço, algo que os funcionários do Tribunal de Justiça têm direito, seria possível resgatar até 15% de adicional por tempo de serviço [para os juízes], e haveria uma solução de um direito que está na lei, mas foi retirado quando se estabeleceu o subsídio, que define o pagamento em parcela única. Se tivesse condições políticas, estabeleceria subsídio único e subteto para todos os funcionários do Tribunal de Justiça, como outros estados já têm. Temos ainda a maior média [salarial] dos tribunais do Brasil.
Cláudio Santos afirma que o governo pode encontrar recursos com privatizações

Ainda no Tribunal de Justiça do RN a média salarial está entre as mais elevadas?
Ainda, mais ou menos igual ao da Bahia, outro que tem uma média salarial de R$ 16 a 17 mil.

No TJ-RN está nesta faixa?
Está nesta faixa de R$ 16 mil [a média salarial]. Então, [subsídio em parcela única] seria muito bom, não só para o Tribunal de Justiça, mas para todo o Rio Grande do Norte, para todos os funcionários públicos. Esses penduricalhos, vantagens, repercussões, alinhamentos e vinculações desvirtuam a folha de pagamento. 

Seria por emenda à Constituição estadual?

Não precisa. Basta ser através de lei. Não é necessário modificar a Constituição. Não há direito constitucional a adicional por tempo de serviço, por exemplo. A norma é infraconstitucional, bastava uma lei para modificar tudo isso.

Teria que ser uma lei aprovada no Congresso Nacional?

Não, aqui mesmo. O Estado tem autonomia para isso. Mas é uma posição pessoal.

Isso poderia ser para servidores?

Sim, mas poderia abranger todos [que estão nas diversas careiras do serviço público estadual]. Inclusive magistrados, Ministério Público, todos. 

O senhor disse que não há condição política. Quais são essas condições que faltam?

Políticas… Dificuldades internas. Não sei ainda avaliar se seria possível transpor. É preciso, também, que o Poder Judiciário, faça o que precisa, mas sempre de forma dosada. Eu já ataquei muitos pontos. A questão arrefeceu um pouco, as coisas estão bem. No próximo ano teremos, provavelmente, uma retomada de relações com o Sindicato. É importante a posição do Sindicato, que não pode ser radical ou político-ideológica. Estamos tratando de recursos públicos. O contexto do Brasil propicia um ambiente favorável a uma busca de uma racionalidade nestes gastos. Eu digo sempre: É preciso que se tenha o Poder Judiciário que o povo possa pagar. E que a Justiça não seja a única prioridade, mas uma das prioridades da Administração Pública. Há outras áreas prioritárias também. O mundo não é só o Poder Judiciário.

Há dificuldades internas então? Isso envolve exigências de salários cada vez maiores, os auxílios, as vantagens, estrutura cada vez mais ampla. É preciso mudar a cultura interna do Poder Judiciário?

Essa tem que mudar e vai mudar lentamente. Alguém precisa mudar isso. É preciso que se acredite que essa mudança no Estado brasileiro, no qual se inclui o Poder Judiciário, se fará pela via democrática do Congresso Nacional. É necessário que isso se faça com a responsabilidade dos deputados e senadores. São medidas antipáticas. Mas me parece que as medidas antipáticas, tomadas por qualquer governo, depois se transforma em credibilidade e popularidade muito grande. É necessário alertar para alguns aspectos, que se diga a realidade. O Rio Grande do Norte tem quantos funcionários públicos? 150 mil? Isso em um Estado com 3 milhões e 500 mil habitantes. Nestes 150 mil você tem 50 mil privilegiados sustentados pelo povo todo. São estruturas que se criou ao longo de décadas. É isso na questão a situação previdenciária. Hoje temos uma norma constitucional que diz que quem entrar a partir de agora no serviço público vai ganhar o teto da previdência [ao se aposentar]. Têm o direito de fazer uma previdência complementar para receber mais. Mas será que o Brasil vai ter condições de esperar essa norma jurídica que só vai ser aplicada em 30 anos? Poderá esperar até lá pagando, no máximo, algo próximo de R$ 5 mil a quem está no INSS e R$ 30 mil a alguém que se aposenta pelo serviço público?

É possível que quebre antes…
Eu trabalho com o horizonte de 5 a 10 anos para se diminuir os proventos dos aposentados no Brasil. E isso pode ser feito hoje. Eu disse que iria acontecer através da tributação. Eles querem fazer o limite do aumento da idade. Não vai adiantar muito. O problema é que o Estado não suporta mais a conta da previdência. Venderam a ideia de que todo mundo tem direito a se aposentar. Foi o que houve como o fundo de pensão das estatais. Muita gente se aposentou com 48 anos de idade. Esses fundos terão condições de pagar mais 30 anos de benefício? Esses fundo das estatais estão todos quebrados, até pela má aplicação dos recursos. Mas esses fundos também foram financiados pela sociedade brasileira. Na hora em que se coloca um litro de gasolina, sai algum dinheiro para o Petros. Ou saiu muito, não sei como está hoje. Na hora em que se coloca uma carta nos Correios, sai um dinheirinho para o Postalis. Para quê? Para financiar a população? Não, para financiar uma parte da população que é empregada nos Correios ou na Petrobras. 

E envolve os outros problemas nas estatais?
Nessa crise toda se pergunta: Se a Petrobras fosse privada teria acontecido isso? Não. Estão mantendo essas empresas estatais, esses grandes grupos, essas grandes estruturas, que são estruturas de poder, de nomeação de liderança, de financiamento de campanha. É para isso que serve. Se não diminui o Estado, não diminui a corrupção. Em alguns anos, começa tudo novamente. É preciso diminuir o tamanho do Poder Público, só tem essa saída para reduzir a corrupção.

E os juízes não precisam contribuir também? Há alguns estados que magistrados reivindicam até auxílio para financiar a escola particular de filhos de juízes…
Tem no Rio de Janeiro.

Já tem em algum estado, então. Não é hora de rever essas situações também?

Eu tomara que essas mudanças sejam feitas pelas vias democráticas, como deve ser feito. Ou vem amanhã um ditador e acaba com isso tudo de cima para baixo. Por isso defendo o subsídio único. Abra a página do Tribuna e está lá os ganhos brutos de cada um. É necessário dizer publicamente quanto se ganha no serviço público. Não adianta dizer que ganha X e ter trinta coisas embutidas indiretamente. Isso ofende o princípio da transparência do serviço público. A cultura do Judiciário tem que mudar muito. Todos os dias chega aqui um juiz pedindo mais funcionários. Todo dia chega pedido de diárias para fazer cursos, congressos, inclusive no exterior. Os juízes ficam com raiva de mim, porque não dou. Não autorizo diária assim. Só autorizo em último caso. É tanto que diminuímos as diárias em certa de 45% de 2014 para 2015. Mas há uma cultura. Veja, o Tribunal de Contas disse que não posso contratar juízes leigos. Para decidir o quê? Briga de vizinho? O Poder Judiciário não é para isso. Fico com muito pena, porque tem juízes que ficam decidindo besteira o dia todo. Não conseguem decidir o que é importante. Tem que acabar com isso. Tem que dificultar o acesso. Não é para decidir coisas menos importantes. Quem tem que decidir coisas menos importantes é o delegado de polícia do bairro. Como tem uma mulher na Zona Norte com oito ações na Justiça? Brigou com o motorista do ônibus, o lixeiro, uma vizinha, uma prima, o caixa do supermercado e outras pessoas. Então ela tem oito ações, porque acha bom brigar, tem uma Justiça à disposição. E o custo disso tudo? É preciso pensar sempre na relação entre custo e benefício.

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