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Uma distância de menos de 100 metros separa a entrada do Aeroporto Juscelino Kubitschek, em Brasília, do portão de embarque para voos nacionais. O trajeto, ladeado de guichês para a emissão de bilhetes aéreos, pode ser concluído em menos de um minuto – tempo que passaria despercebido para a maioria dos passageiros que por ali circula, mas o caminho mais assustador para os políticos que voltam para casa todas as semanas. É onde o povo – ou simplesmente manifestantes – tem a oportunidade de um encontro cara a cara com algumas notórias personalidades normalmente inatingíveis.
“Olhem, é o deputado do dinheiro na cueca. Cadê o dinheirinho, deputado?” Assim foi recebido José Guimarães (PT-CE), o ex-líder do governo Dilma Rousseff, na última quinta-feira, ao dar os primeiros passos no corredor do pânico. E seguem os xingamentos: “Safado”! “Corrupto!”. Os manifestantes se referiam ao famoso caso em que um assessor do petista foi flagrado com dólares na cueca, em 2005.
Era a segunda investida dos manifestantes. A primeira foi contra o deputado Celso Russomano, do PRB de São Paulo. “Ladrão!” “La…”! Alguém avisou que Russomano não estava envolvido na Lava Jato. O publicitário Fernando Souza, 29 anos, explica que eles procuram “os peixes grandes da Lava Jato”. “Cadê o Waldir Maranhão?”, perguntou outro.
A passagem pelo saguão do aeroporto é inevitável para deputados e senadores. À exceção dos presidentes das Casas, que têm a exclusividade de uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) à disposição, todos os demais parlamentares que quiserem viajar custeados pelo poder Legislativo têm de circular entre os demais passageiros. Quem não quiser se arriscar tem de seguir os passos da senadora Gleisi Hoffman ( PT.-PR). Ré por corrupção, ela decidiu mudar de vez para Brasília. Hostilizado em Curitiba, ela trouxe os filhos para a capital e pretende dar um tempo de aeroporto.
Ministros do governo Temer também buscam se preservar. Entre os motivos para solicitar voos da FAB, Henrique Meirelles (Fazenda) e o enrolado Eliseu Padilha (Casa Civil) são recordistas em alegar questões de segurança. Ministro demissionário da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima recorria às mesmas argumentações quando viajava para sua residência, em Salvador.
O clima no aeroporto de Brasília anda tão pesado que a equipe da Polícia Federal que atua no saguão deixou de ser considerada suficiente para conter manifestantes mais radicais. Desde o início do mês, seguranças legislativos foram destacados para proteger os parlamentares — na surdina. De calça jeans, camisetas e sem nenhuma identificação, eles ficam à espreita. No bolso, carregam equipamentos de segurança que vão de sprays de pimenta a pistolas. Em dias mais movimentados – normalmente às terças e quinta-feiras – quatro agentes tomam conta do curto trajeto entre o carro e o embarque. Nos demais dias, o contingente cai à metade.
“As manifestações estão cada vez mais frequentes. É a intolerância aliada ao efeito manada. Um vaia, dois vaiam, quando se vê estão todos vaiando sem nem saber o que é”, explica o diretor do Departamento de Polícia da Câmara, Paul Deeter. “Ninguém está ali para proibir manifestação. A gente só não quer que agridam os deputados ou cheguem a uma distância além do tolerável”, continua. Os policias têm autorização para acompanhar os congressistas até a porta do avião.
A ação dos manifestantes é sempre seguida por celulares a postos para gravar o ato e lançar nas redes sociais. No início do mês, o deputado Weverton Rocha (PDT-MA), autor da emenda que incluiu o crime de abuso de autoridade no pacote de medidas contra a corrupção, teve um tomate esmagado no ombro por um homem que o acusava de tentar enterrar a Lava Jato. Ele credita a ação a uma tentativa de criminalizar a política. “Vou continuar com a minha rotina. Nós não vamos nos acovardar para qualquer tipo de prática que beira o fascismo”, afirmou.
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