Ao investigar essa rede global de investimento chinês no exterior, o BHRRC identificou 102 abusos cometidos entre janeiro de 2021 e dezembro de 2022. A violação registrada com mais frequência está ligada ao impacto dos projetos nos meios de subsistência. Em segundo lugar, desrespeito aos direitos de comunidades nativas. Na sequência aparecem poluição de águas, falta de condições de segurança e saúde nos locais de trabalho e efeitos sobre a vida selvagem.
“Os direitos humanos e os riscos ambientais nas cadeias de fornecimento de minerais de transição associados a empresas chinesas, incluindo exploração, extração e processamento, são significativos”, diz o relatório.
Países mais afetados
A Indonésia é campeã de casos de abusos cometidos por empresas chinesas, com 27, seguida por um país sul-americano, o Peru, com 16. O Brasil não aparece na relação, que cita outros vizinhos: Argentina, Equador, Chile e Venezuela. Porém, A Referência já revelou episódios semelhantes identificados em território brasileiro.
Agora, o relatório gerou uma manifestação de repúdio do movimento brasileiro Democracia Sem Fronteiras (DSF). “A expansão econômica chinesa é reiteradamente marcada pelo abuso ambiental e humano, seja em seu mercado doméstico, seja em seus mercados parceiros e em outros países. Há anos temos alertado para os riscos de parcerias e investimentos com conglomerados chineses”, disse o grupo à reportagem de A Referência.
O comunicado acrescenta que “falta de transparência, descumprimento de protocolos ambientais, denúncias de abusos de direitos humanos, aumento da violência e desestabilização institucional são todas características que acompanham a chegada de mineradoras chinesas em outros países”.
Se o Brasil não aparece no relatório do BHRRC, a presença da Indonésia no topo da lista não surpreende. O país registrou, no começo de 2023, uma greve que terminou em violência em um complexo industrial de fundição controlado pela China na província de Celebes Centrais. O ato de protesto resultou em vítimas fatais após um confronto que colocou colegas frente a frente.
O violento conflito ocorreu no complexo da fundição Gunbuster Nickel Industry (GNI), que acabou com pelo menos duas mortes. As vítimas fatais foram um trabalhador chinês e outro indonésio. Além disso, mais de uma dezena de operários ficaram feridos, segundo a China Labor Watch (CLW), uma ONG de Nova York que monitora as condições de trabalho oferecidas por Beijing dentro e fora do seu território.
“A cobertura da mídia e relatórios de ONGs revelam a intensificação dos conflitos trabalhistas desencadeados por más condições de trabalho, frequentes mortes e ferimentos relacionados a trabalhadores, tratamento desigual e discriminatório entre trabalhadores migrantes da China e trabalhadores locais, bem como demissões de líderes sindicais”, diz o relatório do BHRRC sobre a atuação das empresas chinesas na Indonésia.
Impunidade
O documento destaca que o índice de resposta aos questionamentos feito pelo BHRRC foi muito baixo por parte das companhias chinesas. Apenas sete de 39 empresas avaliadas adotam políticas de direitos humanos. Entre as 22 que foram abordadas para responder às denúncias, somente quatro deram retorno.
Não apenas as companhias parecem ignorar o problema. A Justiça faz o mesmo. Diz o relatório que as vítimas “enfrentaram barreiras persistentes para remediação e justiça.” E acrescenta: “Grupos afetados abriram processos sobre queixas relacionadas a projetos apoiados por empresas ou investidores chineses nos últimos anos, mas o progresso foi limitado.”
A impunidade não é coincidência. As empresas escolhem bem onde implantar seus projetos, e a riqueza mineral da nação hospedeira não é o único critério. “Muitos dos projetos operados ou investidos por empresas chinesas estão localizados em países anfitriões ricos em recursos, com governança fraca e opções limitadas para as vítimas buscarem reparação”, diz o documento.
O DSF, no Brasil, reforça essa questão. “Trata-se de um comportamento sistêmico e devidamente organizado por Beijing, que almeja especificamente países pobres e instáveis para implementar seu modus operandi, sabendo que esses países não possuem instituições ou sociedades civis suficientemente consolidadas a ponto de resistir às violações promovidas por empresas estrangeiras”, disse comunicado emitido pela organização.
Também pesa a frágil legislação chinesa, que não defende os “direitos humanos extraterritoriais, a devida diligência ambiental e o acesso a soluções, deixando trabalhadores e comunidades com poucas opções, isso se houver, para insistir no dever de cuidado das empresas ou recurso efetivo quando ocorrem abusos corporativos.”
Embora o BHHRC foque o relatório nos casos ligados à China, o país não está sozinho. “Essas alegações de abuso estão ao lado de supostos abusos semelhantes cometidos por empresas norte-americanas e europeias”, diz o texto, citando relatório anterior focado em violações cometidas por atores ocidentais.
FONTE: A REFERÊNCIA
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