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segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Juiz que Henrique Alves processou afirma que a eleição deste ano é a mais cara da história




Os quase 25 mil candidatos que disputam um mandato este ano esperam arrecadar e gastar, juntos, até R$ 71 bilhões, de acordo com levantamento feito pela Revista Congresso em Foco no banco de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Um terço a mais do que previram os 22 mil concorrentes no começo da campanha de 2010. Dinheiro suficiente para bancar quase três Copas do Mundo, considerando-se os valores divulgados em balanço pelo governo federal em maio. Ou para cobrir todas as despesas com salário e mandato dos 594 deputados e senadores, inclusive assessores de confiança, por sete décadas. Ou, ainda, custear por seis anos as 14 milhões de famílias (50 milhões de pessoas) que sobrevivem com recursos do programa Bolsa Família.
De 2002 a 2010, as despesas declaradas por candidatos e partidos durante as eleições para cargos federais cresceram cinco vezes, muito acima da inflação de 76% registrada no período. Desde as denúncias que derrubaram o então presidente Fernando Collor, em 1992, o atual sistema de financiamento eleitoral dividiu o noticiário político com o policial em diversas oportunidades. Foi pano de fundo de todos os mensalões, do PT, do DEM e do PSDB. Passou a ser visto como uma janela para a corrupção por autoridades policiais, do Ministério Público e da Justiça. E como uma porta para a distorção na representação dos políticos, na avaliação de cientistas políticos e representantes de entidades engajadas na luta pela melhoria da política no país.
Jogo comprado
“Chegamos ao grau da insustentabilidade. As eleições são um jogo comprado no Brasil”, afirma o juiz eleitoral Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa e coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
Segundo ele, só se elege quem tem muito dinheiro ou é apoiado por grandes empresas. “Isso não é legítimo, porque nega a representação a outros segmentos da sociedade que não o econômico. As representações estão sob domínio do abuso do poder econômico, que, de ilícito, tornou-se regra”, acrescenta o magistrado.
Além do aumento de mais de 30% na estimativa inicial, há outro indicador de que os gastos serão muito superiores este ano: os presidenciáveis, cujos números finais historicamente se aproximam do teto previsto inicialmente, praticamente dobraram a estimativa de 2010. Em busca do posto máximo da República, os 11 candidatos ao Palácio do Planalto pretendem investir até R$ 917 milhões. Somente os três principais nomes – Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB), que substitui Eduardo Campos (PSB) – projetam arrecadar R$ 738 milhões, ou 80% do total. Há quatro anos o limite inicial de despesas dos presidenciáveis era de R$ 482 milhões. Mas, ao final dos dois turnos, as despesas passaram de meio bilhão.
No primeiro mês de campanha deste ano, os candidatos ao Planalto receberam R$ 31,2 milhões, de acordo com a primeira prestação de contas, divulgada no começo de agosto. Apenas os três principais concorrentes ficaram com 94% de todo o dinheiro repassado.
Desde 1997, o Congresso Nacional discute a necessidade de uma lei que limite os gastos das campanhas. Desinteressados em mudar as regras do jogo do qual se beneficiam, os parlamentares preferem não colocar o tema em votação e deixar a definição das despesas máximas com os próprios partidos. Como ninguém quer parar em um teto baixo de arrecadação, temendo ser ultrapassado pelos adversários, as legendas costumam exagerar na estimativa. “É uma corrida sem fim, uma bola de neve. Se um gastar mais, o outro vai tentar superá-lo”, observa o promotor Edson de Resende Castro, coordenador eleitoral de Minas Gerais.
Nas eleições de 2010, as despesas declaradas giraram em torno dos R$ 4 bilhões, cerca de 10% dos R$ 48 bilhões estipulados no começo da campanha. Essa disparidade costuma ser puxada pelos milhares de candidatos a deputado federal e estadual, que apresentam metas de arrecadação muitas vezes irreais. Só o PTdoB de Rondônia, por exemplo, estimou limite de R$ 90 milhões para cada um de seus candidatos à Assembleia Legislativa. Já o PT de Sergipe fixou o teto de R$ 30 milhões para eleger cada deputado federal.
Democracia do dinheiro
Gastos mais elevados de campanha diminuem a competitividade de candidatos com menos recursos, o que dificulta a representação de setores mais pobres da sociedade e favorece relações promíscuas entre empresas e candidatos, afirmam os especialistas no assunto. Para os doadores, as contribuições financeiras são um investimento. Muitos miram contratos com a administração pública ou benefícios como renúncias fiscais ou reduções de impostos para suas atividades. Interesses que, muitas vezes, entram em conflito com o do eleitor que bancou com o voto a eleição de determinado candidato.
“A avalanche financeira que toma conta das eleições é o maior fator de distorção da representação política no Brasil”, diz o líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS), defensor do financiamento público de campanha e da proibição de doações por empresas. “O país está se transformando na democracia do dinheiro”, acrescenta.
A mesma crítica é feita pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado Coêlho. “Sabemos que a sociedade é desigual, mas temos de construir sistema eleitoral que iguale os brasileiros, e não os desiguale ainda mais”, defende. A OAB questiona no Supremo Tribunal Federal (STF) a legalidade do financiamento eleitoral por empresas. O julgamento foi suspenso em abril, com placar de seis a um pela derrubada das contribuições das pessoas jurídicas (leia mais na página 15). Caso os ministros confirmem o posicionamento adotado até agora, esta poderá ser a última eleição com doação do empresariado.
Para o juiz Márlon Reis, há dois caminhos para coibir a desigualdade de condições entre os candidatos: a proibição das doações por empresas, com definição de teto para as contribuições das pessoas físicas, e a divulgação dos doadores em tempo real na internet. “O eleitorado está sendo chamado a legitimar um modelo que não é sustentável nem representativo. Todos os segmentos expressivos da sociedade deveriam se sentar no Parlamento. Mas só quem tem o beneplácito do poder econômico é chamado à mesa. Por isso as pessoas dizem: eles não nos representam”, explica Márlon.


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