Ao tomar posse no ministério da Previdência Social na terça-feira (3), o novo ministro Carlos Lupi disse que pretendia reavaliar “item por item” da reforma da Previdência, chamada por ele de “antirreforma”. Lupi chegou a dizer que criaria uma “comissão quadripartite”, com os sindicatos dos trabalhadores, os sindicatos patronais, dos aposentados e com o governo para discutir com profundidade o tema.
Especialistas ouvidos pela CNN reforçaram a preocupação com o aumento de gastos públicos nos próximos anos com uma possível revogação da reforma previdenciária.
“Eu acho que a revogação da reforma da Previdência não vai acontecer, pois não é compatível com as principais pautas econômicas do governo. Desfazer a reforma ampliaria muito o gasto público e cortaria espaço para outras pautas, como ampliação de investimento, salario mínimo”, destacou o economista Pedro Nery, em entrevista à CNN nesta quarta-feira (4).
Nery destacou que a estimativa com base nos cálculos do IFI não é linear, pois o impacto da reforma é crescente e, portanto, ela tem um impacto maior a cada ano.
Ainda assim, caso houvesse R$ 60 bilhões a mais de gastos por ano, seria o equivalente às despesas do Bolsa Família, comparou Raul Veloso, presidente do Instituto Nacional de Altos Estudos (Inae).
“Se revogar as mudanças que foram penosamente aprovadas em 2019, estaremos indo na contramão de soluções para um tratamento de rigidez orçamentária”, afirmou o economista.
Já segundo o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de assuntos internacionais do Banco Central, o momento para iniciar uma discussão sobre a reforma não é dos melhores, pois um dos maiores desafios do novo governo acerca da agenda econômica se trata do controle de gastos, como assumiu a própria equipe econômica de Haddad.
“O momento não poderia ser pior. O ministro da Fazenda está falando em expansão de gastos, mas abordando a criação de um mecanismo de controle de despesas para colocar os gastos sobre controle, aí vem o ministro da Previdência e fala algo completamente no sentido contrário”, declarou. “Ou seja, qualquer mecanismo de controle de gastos não funcionaria com a reforma revogada”, acrescentou.
Para Schwartsman, o mais apropriado seria envolver discussões sobre o andamento de outras reformas nos próximos anos.
“A reforma da Previdência mudou a trajetória do gasto público, agora precisaríamos estar discutindo uma agenda inteira que deveria ser feita, como a reforma administrativa, reforma tributária… vai parar a agenda de reformas para discutir o que já foi aprovado lá atrás?”, questionou.
Déficit e superávit na Previdência
Lupi destacou em sua posse que “a Previdência não é deficitária” e que provaria a afirmação “com números, dados e informações”. Ele explicou que o problema é que a conta da Previdência inclui gastos não previdenciários – como os benefícios de prestação continuada, o BPC – e não leva em conta receitas com destinação previdenciária – como PIS e Cofins.
De acordo com o novo ministro, o resultado seria positivo se as despesas sociais fossem retiradas e a arrecadação ligada à seguridade fosse somada. Consultados pela CNN, especialistas discordaram do argumento defendido por Lupi para assegurar um superávit previdenciário e cultivar um debate sobre a reforma da Previdência.
“A Previdência pública não é superavitária e, mesmo incluindo as receitas ligadas à seguridade social, como PIS e Confins, as despesas com Bolsa Família, Abono e BPC também ultrapassam a arrecadação e o déficit seria um pouco menor, mas ainda assim, o equivalente a 2,2% do PIB até novembro”, afirma Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter.
“Além do elevado gasto com benefícios previdenciários de 8,2% do PIB, é preciso olhar para nossa evolução demográfica e mensurar o impacto considerando as regras atuais”, completou.
A arrecadação do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) foi de R$ 466,195 bilhões de janeiro a novembro de 2022, contra R$ 734,11 bilhões de recursos destinados aos benefícios da Previdência. Ao todo, o resultado foi de déficit de R$ 267,915 bilhões no período. Raul Veloso pontuou que os gastos poderiam ser ainda maiores ao incluir no cálculo gastos de seguridade social.
“Quanto a Cofins, PIS etc., essas são receitas do OSS – Orçamento da Seguridade Social -, e não da Previdência. Se for por essa lógica, terá de colocar também os demais gastos da seguridade social, inclusive o Auxílio Emergencial. Com tudo isso lá dentro, o déficit desse aglomerado ficará maior ainda do que a parte especificamente previdenciária, na direção oposta do que o ministro quer mostrar”, avalia o economista.
CNN
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