A ameaça do presidente russo Vladimir Putin de usar armas nucleares na Ucrânia não foi encarada pelos EUA e seus aliados como mero blefe, alerta que foi feito pelo próprio líder russo. Prova disso são as recentes medidas de Washington para monitorar a movimentação militar da Rússia e tentar antecipar um eventual ataque. Entretanto, as condições são desfavoráveis aos órgãos de Inteligência, e talvez seja impossível saber antecipadamente caso Moscou opte pela medida extrema.
O risco tornou-se real a partir do momento em que a Rússia formalizou a anexação de regiões ucranianas que suas forças já controlavam. Nelas, no começo da semana, foi realizado um referendo forjado sob o argumento mentiroso de permitir que os moradores decidissem. Moscou trabalhou para assegurar que o resultado lhe favorecesse, com denúncias de que pessoas foram forçadas a preencher as cédulas de votação sob ameaça armada. Assim, anunciou que cerca de 90% dos votos aprovam a anexação.
A declaração das regiões de Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhya e Kherson como parte de seu território pela Rússia, na sexta-feira (30), carece de reconhecimento internacional. Mas Putin e seus aliados fizeram festa com o desfecho da votação e realizaram uma cerimônia em Moscou para festejar a conquista dos novos territórios.
“Os resultados são claros. Bem-vindo ao lar, à Rússia!”, disse Dmitry Medvedev, ex-presidente que atua como vice-cehfe do Conselho de Segurança da Rússia e que se manifestou através do aplicativo de mensagens Telegram, segundo a agência Reuters.
São esses resultados que tornam a ameaça nuclear uma possibilidade real e ecoam as palavras de Putin. “No caso de uma ameaça à integridade territorial de nosso país e para defender a Rússia e nosso povo, certamente faremos uso de todos os sistemas de armas disponíveis a nós”, disse o presidente na quarta-feira (21) passada. “Isso não é um blefe”.
Não é difícil interpretar o raciocínio do presidente da Rússia: uma eventual contraofensiva ucraniana para reconquistar uma dessas quatro regiões poderia levar a um ataque nuclear contra os ucranianos.
Jake Sullivan, conselheiro de segurança do governo norte-americano, ratificou a sugestão de Putin e disse que o governo Biden leva “muito a sério” a ameaça. Entretanto, alertou Moscou para as “consequências catastróficas” do uso de armas nucleares, que entraram em cena pela primeira e última vez em um campo de batalhas em 1945, quando os EUA atingiram Hiroshima e Nagasaki.
Inteligência em ação
Na semana passada, Washington já começou a se preparar para a possibilidade de Putin cumprir a ameaça. Empresas que monitoram o espaço aéreo identificaram aviões norte-americanos de vigilância eletrônica nas proximidades do território russo, provavelmente com a missão de analisar a movimentação militar e identificar eventuais sinais de preparação para um ataque nuclear.
Porém, todo o trabalho de inteligência dos EUA pode ser insuficiente. Isso porque, segundo analistas, o mais provável seria o uso pela Rússia de armas táticas, cujo alcance é reduzido e a precipitação radioativa se limita a cerca de um quilômetro. Diferente das armas nucleares estratégicas, capazes de destruir cidades inteiras como em 1945, as táticas servem para aniquilar posições estratégicas ucranianas.
Calcula-se que a Rússia tenha à disposição de suas forças armadas cerca de 1,9 mil ogivas nucleares táticas, o maior arsenal do tipo no mundo. E a facilidade de dispará-las cria um problema, vez que podem partir da maioria dos jatos das forças armadas russas, bem como de lançadores de foguetes e mísseis convencionais.
“Quase todas as armas dos russos têm capacidade nuclear. Se for um sistema de artilharia, se for um sistema de defesa aérea, se for um torpedo, se for um míssil de cruzeiro, pode ter uma arma nuclear”, disse ao site Politico um ex-funcionário sênior do Conselho de Segurança Nacional que ainda assessora o Comando Estratégico dos EUA e não quis se identificar.
Dessa forma, é praticamente impossível saber quando a Rússia substituiu munição convencional por nuclear em seus jatos ou lança-foguetes. “Para essas armas nucleares menores, provavelmente não saberemos”, disse outra autoridade norte-americana com acesso às informações de inteligência sobre a Rússia e que igualmente falou sob condição de anonimato.
Belarus com capacidade nuclear
O eventual ataque poderia, inclusive, sequer partir do território russo. No final de agosto, o presidente de Belarus Alexander Lukashenko direcionou uma ameaça clara ao Ocidente ao anunciar que as forças armadas do país modificaram seus aviões militares para que sejam capazes de carregar ogivas nucleares.
O anúncio foi direcionado particularmente à Polônia, com quem Belarus faz fronteira e que é membro da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Segundo a agência belarussa estatal de notícias Belta, Lukashenko disse confiar que os militares poloneses entendam como Minsk poderia reagir em caso de uma escalada.
A Referência
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