Ícaro Carvalho
Repórter
As despesas do Rio Grande do Norte com pagamento de folha de servidores representam um custo médio de R$ 3,7 mil para cada potiguar, segundo aponta o mais recente Boletim de Finanças da Secretaria de Tesouro Nacional (STN), que usa dados de 2022. O custo está acima da média nacional, que é de R$ 3 mil, e coloca o RN em primeiro lugar no Nordeste com o maior gasto e em nono no Brasil. Os altos custos com funcionalismo, no entanto, não se refletem em serviços para a população potiguar. Há déficit de policiais civis e militares, médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem e professores, gerando vacâncias e obrigando o Estado a ampliar a terceirização em setores para fechar as escalas.
Segundo dados do relatório, o RN só fica atrás do Distrito Federal, Roraima, Acre, Tocantins, Amapá, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia. No tocante ao Nordeste, o primeiro estado a aparecer após o RN é Sergipe, com custo per capita de R$ 3,2 mil. Estados como Piauí, Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Bahia, Ceará e Maranhão tem custos per capita com pessoal que variam de R$ 1,7 a R$ 2,8 mil. Atualmente, a folha do RN possui cerca de 111 mil servidores, sendo 53 mil ativos e 58 mil aposentados e pensionistas. O gasto mensal com pessoal ultrapassa R$ 770 milhões, o que dá mais de 50% da Receita Corrente Líquida (RCL).
O estudo mostra ainda que o Estado aumentou o aporte com recursos do Tesouro Estadual para complementar a previdência, saltando de 11,7% em 2021 para 12,4% em 2022. Atualmente, esse aporte mensal gira em torno de R$ 150 milhões para cobrir a insuficiência de recolhimento do sistema previdenciário do Estado.
Segundo interlocutores do Governo, especialistas e representantes de sindicatos de classes essenciais no Rio Grande do Norte, vários fatores explicam essa discrepância entre o alto custo da folha e a falta de servidores em determinadas áreas. São apontadas questões como a falta de concursos frequentes e nomeações, uma vez que os ativos é quem “sustentam” a previdência e o pagamento dos inativos; a contratação de terceirizados para atividades meio e fim, que acabam não contribuindo para a previdência estadual, e a arrecadação do Estado, que não acompanha os custos.
O secretário de Administração do Rio Grande do Norte, Pedro Lopes apresenta dados de um estudo feito pela gestão sobre os quatro últimos ciclos de governos estaduais, de 2006 a 2022, e aponta que, a primeira gestão da governadora Fátima Bezerra (PT) foi a única em que a evolução da receita foi maior do que o gasto com pessoal, 55,4% contra 44,4%, respectivamente.
“Nos três anteriores (governos) ocorreu exatamente o contrário, as despesas cresceram mais que a receita, e assim chegamos em dezembro de 2018 com o maior comprometimento histórico de gasto com pessoal em relação à receita corrente líquida, 63%. O que explica isso ter acontecido suponho ter sido reiteradas concessões de vantagens sem o devido cuidado com o comportamento das receitas correntes e futuras, gerando o desequilíbrio fiscal e uma situação administrativa caótica que levou o Estado a não adimplir com o pagamento regular dos servidores, chegando a ter até quatro folhas salarias em atraso”, disse.
Pedro Lopes aponta ainda que há grande variação salarial entre as categorias funcionais do RN, “mas particularmente não considero o valor individual como fator preponderante para o elevado gasto com pessoal em relação a receita corrente líquida”.
“São 53 mil servidores ativos e apenas 1.121, pouco mais de 2% do total, recebem mais de R$ 20 mil por mês. Já 39 mil servidores, quase 74% do total, recebem até cinco salários mínimos brutos mensais, o que não podemos considerar como caros. Isso acontece também na folha de inativos e pensionistas, pois dos 58 mil beneficiários, 1.693 ganham acima de R$ 20 mil mensais e 33,8 mil recebem até 5 salários mínimos”, enumera.
Para o professor em economia e ciências econômicas, Rodrigo Lima de Oliveira, o Estado precisa encontrar mecanismos para tornar a máquina pública eficiente e encontrar saídas para reduzir gastos e aumentar as receitas, medidas que possuem soluções impopulares, como demissões e/ou aumento de impostos. Rodrigo aponta que medidas como suspensão de concursos e reajustes para 2024 são uma tentativa do Governo de reverter o cenário.
“As causas desse aumento de despesas pode ser explicado nos reajustes salariais visto nos últimos anos e o aumento de pagamento nas causas previdenciárias. O que incomoda, socialmente, não é o gasto com o pessoal, mas sim a eficiência do serviço público prestado”, aponta. “Tem duas soluções: diminuir despesas, como reduzir salários, ou aumentar receitas, isto é, aumentar imposto. São duas medidas impopulares. Do ponto de vista social, na composição dos salários em Natal, o serviço público representa por grande parte da renda gerada em Natal. Então se há corte de salários, há diminuição nas compras no comércio. É um efeito em cadeia”, complementa.
Apesar do alto custo, RN tem déficit de servidores
Mesmo tendo um dos maiores gastos com pessoal do Brasil, o Rio Grande do Norte possui déficits de servidores e profissionais em diversas áreas do Estado. Além do Idema, que a Secretaria de Estado da Administração (Sead) considera precisar de um concurso com “alta prioridade”, faltam policiais civis, militares, profissionais da saúde e professores. Na educação, estimativas de interlocutores da área apontam déficit de pelo menos 500 professores.
“Temos um déficit de funcionários na educação e em outras áreas também. Temos a terceirização de alguns serviços e acredito que seja um erro, porque você tem uma despesa, mas do ponto de vista da LRF esse pessoal não é computado nessa despesa e temos poucos recursos no Estado. E não estamos nem perto de termos um Estado que valoriza os servidores, pois temos categorias, como a nossa, que tem Plano de Carreira, mas não tem nem reajuste anual”, aponta Bruno Vital, coordenador do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do RN (Sinte-RN).
Na saúde, são vários os relatos de hospitais e unidades de saúde com falta de profissionais, insumos e infraestrutura, além de situações históricas e crônicas, como os corredores do Walfredo Gurgel. Para a coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do RN (Sinte-RN), Rosália Fernandes, os índices de terceirização do Estado tem crescido nos últimos anos, e mesmo assim não tem suprido as vacâncias da rede de saúde.
“O Governo não coloca nesses gastos per capita o aumento da terceirização e privatização, que aumentaram consideravelmente nesse governo. Na saúde ela é crescente, com contratação de cooperativas de áreas que são fins, como médicos, enfermagem, que antes só existia na higienização e vigilância. Quem toma de conta nos hospitais são essas empresas privadas”, opina. “Essas pessoas não são do quadro do Estado. O que isso significa: atende a população, tudo bem, mas esses profissionais não contribuem com o Ipern, gerando um déficit previdenciário”, relembra.
A segurança pública é outra área que acaba sofrendo com déficit de profissionais. Na Polícia Militar, a legislação determina pouco mais de 13 mil agentes, no entanto, são apenas 9 mil na tropa. Na Polícia Civil, mesma situação. O efetivo que era para ser de 5.150 atualmente é de pouco mais de 2 mil agentes, delegados e escrivães.
“Eu vejo que falta uma gestão adequada de pessoal. Nas corporações da PM, por exemplo, temos pessoas em desvio de função que é um número absurdo. Existe uma falta adequada de distribuição, pois tem locais que têm demais, outros têm de menos. Outro fator determinante é a falta de planejamento de ingresso de pessoal. Por exemplo, o Rio Grande do Norte passou mais de uma década sem ter concurso para as forças de segurança. O que acontece: faz um concurso e para 1.000 pessoas, causando uma desordem na questão financeira do Estado”, reclama o vice-presidente da Associação dos Subtenentes e Sargentos Policiais e Bombeiros Militares do RN (ASSPMBMRN), Eliabe Marques.
“Já também não podemos afirmar que temos funcionários demais, leia-se servidores ativos. Atualmente temos 14 mil servidores ativos a menos do que tínhamos em 2010, o que vem ocasionando um déficit em todas as áreas do Governo, e quase todas somente funcionam com relativa ‘normalidade’ devido a contratação de bolsistas, estagiários, terceirizados, temporários e comissionados, caso contrário muitos órgãos já estariam com as portas literalmente fechadas”, explica o secretário de Administração, Pedro Lopes.
TRIBUNA DO NORTE
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