Foto:Magnus Nascimento
Gabriela Liberato
Repórter
Em visitas institucionais, o embaixador de Portugal Luís Faro Ramos, que esteve no Rio Grande do Norte nos últimos dias de abril, acredita no potencial do Estado para atrair mais investimentos em energias renováveis. “Apesar de competir com o Ceará, há estudos científicos que mostram que o Rio Grande do Norte é campeão potencial para a produção de energia limpa, então eu acredito que existirá ainda mais empresas disputando pela questão da energia aqui no RN”, afirma o diplomata.
Em estadia breve, o embaixador encontrou-se com o reitor da UFRN, José Daniel Diniz, e com a governadora do RN, Fátima Bezerra, em discussões sobre futuros investimentos energéticos e acadêmicos no Estado. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, o embaixador revelou iniciativas de maior fomento à aproximação entre Portugal e Rio Grande do Norte e os novos investimentos portugueses em terras potiguares. Ramos ainda discorre sobre o aumento da imigração após o acordo de mobilidade entre países de língua portuguesa, assinado em 2021, que facilita a mobilidade em situações de estadia de curta duração, estada temporária, visto de residência e autorização de residência. O embaixador ainda reconhece os fatos do passado entre Portugal e Brasil, e revela interesse em inaugurar novas unidades das Cátedras do Instituto Camões em mais Universidades Brasileiras. O diplomata revelou também que retornará ao RN em junho, para encontro no geoparque em Currais Novos. Confira a entrevista.
Portugal tem investido no Rio Grande do Norte, sobretudo na área de energias renováveis. Como surgiu esse interesse?
O interesse pelo investimento se deu pelo Brasil ter um ótimo potencial para a produção de energia limpa, que é o futuro. Aqui nós temos o local ideal para o desenvolvimento de energias como solar e eólica, e eu acho foi isso que atraiu a atenção de empresas como a EDP e a Galp, empresas estatal e privada, respectivamente. As empresas viram o potencial que o Brasil apresenta energeticamente, e também socialmente, pois a energia limpa é o futuro, é necessário investimentos grandes nela. Apesar de competir com o Ceará, sei que há estudos científicos que mostram que o Rio Grande do Norte é campeão potencial para a produção de energia limpa, então eu acredito que existirá ainda mais empresas disputando pela questão da energia aqui no RN.
Portugal é um destino procurado pelos brasileiros, inclusive potiguares, seja para visitar ou para morar. Como a presença de um número alto de residentes brasileiros no país é vista pelo governo português?
Isso é reflexo da forte relação entre Portugal e o Brasil, que está cada vez mais forte. A população brasileira em Portugal está crescendo, e já não estou falando só de turistas, porque tem muito turistas brasileiros visitando o nosso país, mas eu estou falando de pessoas que vivem lá em Portugal, trabalham e estudam lá, já tem mais de meio milhão, eu creio. É uma estatística que é feita por baixo, pois ainda há pessoas que estão no processo de se regularizar. E todos os brasileiros são bem-vindos. Também é importante salientar que há pouco tempo foi aprovada a nova legislação que permite a mobilidade dentro de países de língua portuguesa, e o Brasil e Portugal são países que se beneficiam muito com isso.
Os brasileiros costumam visitar Portugal. Daqui do RN temos voo regular direto para lá. Há expectativas de aumentar o número de voos na escala Natal/Portugal?
Eu sei que a TAP, neste momento, aposta muito forte no Brasil. Eu não posso falar pela TAP, porque a TAP tem as suas atividades, mas eu sei que para nós, e para vocês também, é muito importante que essa companhia aposte forte aqui no Brasil. Neste momento, que é época de baixa procura no Brasil, tem seis voos, e a partir de outubro, que é a alta estação aqui, serão sete voos, sendo um voo por dia apenas para o Rio Grande do Norte. Não podemos esquecer que são mais de 90 voos por semana para várias cidades do Brasil, com uma taxa de ocupação entre 80% e 90%. Então assim, não há nenhum país no mundo para onde a TAP voou com tanta regularidade e tanta frequência, então imagino que apostar no Brasil é uma aposta que vale a pena ser continuada.
Este ano completaram 50 anos da Revolução dos Cravos, que levou ao fim de uma ditadura em Portugal. Qual a visão de democracia que o país tem hoje?
Cinquenta anos depois nós temos que ter o entendimento de que a democracia e a liberdade não são dados adquiridos. Sempre pode haver o retrocesso, e isso seria muito mau, não é? Eu estive em um momento com os alunos do curso de Relações Internacionais, e lá enfatizamos para os jovens a importância de entender o que foi a Revolução dos Cravos, pois os jovens, que nunca viveram algo do tipo, não sabem o que é estar privado de liberdade, não poder ir tomar um café, ter polícia batendo à sua porta… É bom lembrar a juventude que essas coisas existiram. Para que nós estejamos sempre alertas, e para que possamos dar valor ao que é viver em liberdade e democracia.
Fazendo um paralelo entre Portugal e o Brasil, o senhor avalia que há um estado democrático no Brasil?
Acho que Portugal e o Brasil são países que tiveram altos e baixos com relação à democracia em seus respectivos países, mas neste momento em que os dois países estão vivendo em estados democráticos, é muito bom para a nossa relação que, por causa disso, está num nível excelente. Agora, é importante ressaltarmos que infelizmente a democracia pode ser ameaçada por ideais diferentes. Como em Portugal, e na Europa em geral, que têm partidos políticos que defendem valores que não são nada democráticos, que defendem ideias como xenofobia, desigualdades, preconceitos, discriminação de raça, de sexo, de tudo… Então nós devemos estar atentos. Felizmente ambos os governos estão democráticos, por isso temos agora uma relação intensa e boa, pois são dois países que partilham valores de liberdade.
Em visita à reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o senhor tratou sobre a ampliação de acordos de cooperação na área acadêmica. O que podemos esperar como resultado deste encontro?
Entre Portugal e o Brasil há o intercâmbio de alunos e de professores, já há centenas de convênios entre, não apenas as Universidades, mas também entre os politécnicos, como os Institutos Politécnicos de Bragança e de Setúbal. Aqui no Brasil há também as Cátedras do Instituto de Camões, e ontem conversando com o reitor da UFRN lancei-lhe um desafio, falei para ele pensar se há interesse da universidade em ter uma Cátedra de Camões aqui na UFRN, então quem sabe se em minha próxima visita nós possamos estar inaugurando uma Cátedra também aqui na UFRN.
A relação Brasil/Portugal é histórica, mas também polêmica. O governo até se manifestou recentemente sobre o passado colonial, compensação de ex-colônias pela exploração excessiva e pela escravidão, por exemplo. Como o senhor avalia esse passado e como acredita que deva ser o posicionamento daqui para frente?
Quando nós olhamos para esse passado, nós temos que olhar para o passado todo. Se pensarmos nesses 524 anos, quase metade é com o Brasil independente, soberano. Portanto, esse passado não é só passado colonial. Quando nós falamos nestas questões, temos que olhar de uma maneira inclusiva. E dessa maneira inclusiva, mais de 200 anos são com o Brasil independente. É uma questão complexa e que tem sido falada há vários anos. É preciso enfim assumir que houveram erros históricos, assumir que o desenvolvimento de determinada sociedade ficou impactado por isso tudo, porque tudo isso é verdade. Agora, como é que nós vamos resolver isso? Como é que nós vamos fazer essas contas com o nosso passado em conjunto? O país que é hoje um país diferente, no caso de Portugal, não se coloca só em relação ao Brasil, coloca-se em relação às colônias na África também, que aliás são independentes há 49 anos, em um espaço temporal diferente. Eu acho que são questões que devem ser enfrentadas com responsabilidade, com seriedade e, sobretudo, de um modo muito inclusivo, com todo mundo tendo a oportunidade de se pronunciar. E eu acho que isso é o mais importante, é um caminho que ainda está por fazer.
Há uma teoria de que o Brasil foi descoberto aqui no Rio Grande do Norte, na cidade de Touros, e não na Bahia como historicamente é posto. O senhor acredita nessa possibilidade? Pelo olhar português, há algum indício que alimente essa tese?
Eu não posso me meter nisso. (risos) Lá em Portugal o que é dito é que em 1500 Pedro Álvares Cabral chegou a Porto Seguro, que era na Bahia. Eu sei que há essa teoria, mas eu não sou historiador nem acadêmico, o que eu sei é que, por onde eu vou no Brasil, o carinho que eu vejo ser demonstrado por Portugal é enorme. Seja no Rio Grande do Norte, seja na Bahia, seja no Rio Grande do Sul. Eu acho que é isso que importa. Pode ter sido aqui, pode ter sido lá. Não vamos discutir isso porque eu também não sei. Eu não tenho ciência nem história para isso. Agora, tendo entrado aqui ou lá, o que eu sei é que quando nós comemoramos os 500 anos com o Tratado de Porto Seguro, há 24 anos atrás, nós estávamos lá, e esse casamento entre os dois países já é antigo e está ótimo.
Tribuna do Norte
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