Divulgação/Prefeitura de Sinimbu
A reconstrução do Rio Grande do Sul deveria considerar estruturas mais resilientes a episódios de clima extremo, afirmam especialistas em mudanças climáticas, economia e urbanismo.
A começar pelo plantio de vegetação nativa, combinadas ao plantio de alimentos, para recuperar com urgência 1,165 milhão de hectares em áreas de preservação permanente e reserva legal no estado, já previstas em lei.
Para fazer o plantio e manejo o potencial é de geração de 218 mil empregos só no Rio Grande do Sul. Em todo o Brasil, seriam 5 milhões de novos empregos ao longo de toda a cadeia de valor para o plantio de 10 bilhões de mudas em 12 milhões de hectares — o equivalente à extensão da Inglaterra.
As estimativas são do estudo “Os Bons Frutos da Recuperação Florestal”, do Instituto Escolhas, empresa especializada na interface de temas econômicos e ambientais para propor soluções para os problemas de desenvolvimento do país.
“Nós não temos essa infraestrutura do ponto de vista produtivo estabelecida no Brasil. É preciso fazer um investimento da ordem de R$ 220 bilhões, e os retornos são bastante significativos”, diz Sérgio Leitão, diretor da entidade.
“No Rio Grande do Sul, dos 1,165 milhão de hectares que deveriam ser plantados, 500 mil hectares estão nas chamadas matas ciliares, ou seja, nas margens dos rios, nas beiras dos cursos d ‘água, que é exatamente onde se torna mais urgente essa recuperação”, explica.
Outros 650 mil hectares estão em áreas privadas, segundo o estudo.
Para o especialista, a reconstrução econômica do estado, que tem sido objeto da negociação entre o governo federal e governo estadual, precisa também abranger a recuperação ambiental para se prevenir e se proteger contra a repetição de eventos climáticos extremos.
“A infraestrutura natural retarda a velocidade da água no caso de uma enchente e permite que essa água se infiltre, e, portanto, deixe de virar uma fonte de alagamento”, explica o diretor do Instituto Escolhas.
“A gente defende que essa recuperação das áreas se dê de forma produtiva, usando modelos de consorciamento de vegetação com a produção de alimentos porque isso traz retorno econômico”.
Para isso, será necessário produzir sementes e mudas, formar e contratar profissionais especialistas no plantio e manejo, além de investimento em pesquisas.
“Recuperar florestas é uma oportunidade econômica imensa, com geração de ganhos sociais e ambientais”, conclui.
A oportunidade não vale somente para o Rio Grande do Sul, mas para construir resiliência às mudanças climáticas e desenvolvimento socioeconômico em todo o país.
Só no estado do Pará, por exemplo, a recuperação econômica de áreas desmatadas geraria 1,5 milhão de empregos e permitiria a redução da pobreza em 50%, de acordo com o estudo.
A atividade de recuperar a vegetação nativa é intensiva em mão de obra, especialmente nos três primeiros anos. Combinada à produção de alimentos e à produção madeireira, por exemplo, em sistemas agroflorestais, significa pelo menos 20 anos de manutenção de empregos.
“Todo o esforço de investimento, mas também o seu retorno financeiro, faria o Brasil cumprir a meta que o país assumiu em 2015, quando houve o acordo do clima em Paris, durante a COP21, com obrigações que se transformaram, por sua vez, nas NDCs, que são as Contribuições Nacionalmente Determinadas”, lembra o especialista.
Desde então, pouco foi feito de restauração ecológica aliada ao uso econômico. “De 2015 para cá a gente não fez praticamente nada, pouco menos de 100 mil hectares”, diz.
Exemplos Internacionais
Nos Estados Unidos, a Lei da Redução da Inflação, (IRA, na sigla em inglês), de 2022, propõe o Civilian Climate Corps, a contratação de pessoas para cuidar da recuperação da infraestrutura natural — em outras palavras, o plantio de vegetação nativa combinada a alimentos.
Além de tornar o país mais resiliente à crise climática, o “Corpo Civil do Clima” gera empregos, especialmente na região conhecida como Cinturão da Ferrugem, carente de oportunidades de trabalho.
A iniciativa é semelhante ao que o presidente Franklin Roosevelt fez na década de 1930, durante a Grande Depressão Americana.
Nesta linha, outra iniciativa atual ocorre no Quênia, cujo governo decretou um feriado nacional para incentivar o plantio de 100 milhões de mudas de árvores.
Cerca de 150 milhões de mudas foram disponibilizadas gratuitamente no dia 13 de novembro do ano passado em centros de agências florestais para serem plantadas em áreas públicas definidas previamente.
O objetivo é chegar a 15 bilhões de árvores plantadas em 10 anos, para tornar o país mais resiliente à crise climática.
O governo também encorajou que cada um dos 50 milhões de quenianos comprasse pelo menos duas mudas de árvores para plantar nos jardins de suas casas.
A ideia foi inspirada na primeira mulher africana a receber um Prêmio Nobel da Paz, em 2004, Wangari Muta Maathai. A professora e ativista, falecida em 2011, fundou o Movimento do Cinturão Verde, uma organização não governamental ambiental dedicada ao plantio de árvores, consorciada ao plantio de alimentos, como forma de proteger o solo contra a erosão e recuperar os aquíferos — espaços de produção de água.
“O Brasil precisa urgentemente entender que o plantio de árvores não significa apenas uma questão ecológica. É uma questão econômica, social, e de preparar o país para esses dias de mudança de clima que infelizmente chegaram da forma mais trágica possível”, alerta o diretor do Instituto Escolhas.
Como mostra a experiência dos milhares de salvamentos de pessoas e animais realizados por civis no Rio Grande do Sul, e as iniciativas de plantio de árvores no Quênia e nos Estados Unidos, também a recuperação ecológica poderia se dar com o apoio das pessoas.
“Pequenos agricultores vão se candidatar ao plantio, recuperar suas propriedades, produzir alimentos. E vamos ter a necessidade de um grande apoio do governo para que isso possa acontecer”.
CNN
Nenhum comentário:
Postar um comentário