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quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Infectologista fala sobre associação de casos ao Zika e o surto de microcefalia


Alfredo Passalacqua, infectologista, destaca que tudo o que é novo deve ser investigado – Foto Wilson Moreno

Fonte: GAZETA DO OESTE 

O Ministério da Saúde (MS) confirmou no sábado passado, 28/11, a relação entre o Zika vírus e o surto de microcefalia no Nordeste. A confirmação ocorreu a partir da identificação, por parte do Instituto Evandro Chagas, da presença do vírus em amostras de sangue e tecidos de um recém-nascido que foi a óbito no Ceará, segundo informou o próprio Ministério da Saúde, em seu portal.
De acordo com o boletim do Ministério da Saúde, até o dia 28 de novembro, haviam sido notificados 1.248 casos suspeitos de microcefalia em todo o País, sendo Pernambuco o Estado com maior número de casos, 646. No Rio Grande do Norte haviam sido notificados 79 casos. A Secretaria de Estado da Saúde Pública (SESAP) deve emitir hoje um novo boletim, com os números atualizados do MS, mas, segundo os números divulgados na quarta-feira passada, 25/11, Mossoró era o segundo município do Estado em número de notificações, contabilizando cinco casos.
O aumento no número de casos de microcefalia acendeu o alerta dos órgãos de saúde pública em todo o país. Ainda de acordo com a Secretaria, dos casos notificados, 40% das mães relataram ter algum sinal e/ou sintoma de doença exantemática (manchas pelo corpo) durante a gravidez.
O médico infectologista Alfredo Passalacqua explicou que a razão da associação dos casos ao Zika vírus, como vem sendo investigado, está justamente nesse aumento das notificações e falou sobre os fatores que podem ter influência em uma epidemia.
“A gente tem duas situações extremamente favoráveis para uma, digamos assim, epidemia. Primeiro, a gente tem uma população suscetível, que é o brasileiro, que o brasileiro nunca teve Zika vírus, então ele é suscetível, não é imune, e a infestação por um inseto, que vai transmitir o vírus pela picada, como transmite a dengue”, menciona.
“Então tem um vírus que, classicamente, já tem um histórico de atingir o sistema nervoso central, tem uma população suscetível. Nessa população suscetível você tem gestantes, que compõem uma população mais suscetível ainda, porque com ela tem o feto. O feto não tem imunidade, a imunidade é passada da mãe para o feto. Essa mulher não é imune ao Zika vírus, ela nunca viu o Zika vírus na vida, nunca criou anticorpos. Então, juntando tudo a isso, quando eles colheram histórias dessas mulheres que tiveram crianças com microcefalia, ou seja, com má formação do sistema nervoso central, com diminuição do volume do encéfalo, elas relataram que em um momento da gravidez tiveram toda a sintomatologia extremamente característica de Zika vírus”.
Mas o médico destaca que não são todas as mulheres que tiveram crianças com microcefalia que tiveram o contato com o vírus, até porque, outros fatores, como causas genéticas, uso de medicações e até de drogas podem afetar a formação do sistema nervoso central.
Entre as mulheres que relataram sintomas do Zika vírus, no entanto, ele comenta relatos de febre baixa, vermelhidão no corpo acompanhada de coceira, olho avermelhado e inchaço, principalmente nas mãos. “E era aquela coceira bem passageira, três quatro dias de coceira e rapidamente ficavam boas. Quer dizer, não é uma coisa clássica da dengue, clássica do Chikungunya, não era uma coisa clássica dessas viroses que estavam circulando”, diz ele.
Aliado a isso, a preocupação é reforçada pela insuficiência de informações sobre o Zika vírus que, segundo o médico, surgiu na África. “Qual é a experiência que a gente tem com o Zika vírus? Nenhuma. Qual a experiência que a África tem em termos de notificação de populações que têm o Zika vírus no interior da África e que vão nascer com microcefalia? Não se tem muito bem esses dados. Então, é uma doença que não se fala muito, não se comenta muito porque é de um outro continente, é de um continente mais pobre que, eventualmente, não faz levantamento”, comenta sobre a necessidade de saber mais sobre o vírus.

‘Tudo que é novo tem que ser investigado’
O médico ressalta a necessidade de investigação. “É uma coisa nova para a gente. Tudo que é novo tem que ser investigado e, é óbvio, causa preocupação. Tanto é que tem colegas médicos orientando a mulher: ‘Olha, se você está pensando em engravidar agora, a sugestão é que não engravide'”, comenta Alfredo Passalacqua, lembrando que se trata de uma questão delicada.
De acordo com o infectologista, a influência do vírus na formação do sistema nervoso central pode estar relacionada ao momento em que mãe e feto tiveram contato com o Zika vírus. Isso porque, como explica o médico, a formação do sistema nervoso central começa nos primeiros três meses após a organogênese. “A gente não sabe bem, mas, provavelmente, talvez mais no princípio da gestação seja uma fase que ocasione casos mais graves de microcefalia e mais tardiamente talvez seja um momento que sejam casos menos graves e cabe também, mesmo aquelas gestantes que tiveram sintomatologia de Zika, cujas crianças nasceram normais, eu acho que seria bastante interessante acompanhar a evolução dessas crianças. Porque não nasceu com microcefalia, mas pode ter nascido com eventuais danos do sistema nervoso central que só vão ser observados com o passar do tempo”, alerta o infectologista.
O Ministério da Saúde informa que “as investigações sobre o tema devem continuar para esclarecer questões como: a transmissão desse agente; a sua atuação no organismo humano; a infecção do feto e período de maior vulnerabilidade para a gestante. Em análise inicial, o risco está associado aos primeiros três meses de gravidez”.

ORIENTAÇÕES
O Ministério da Saúde emitiu algumas orientações que devem ser seguidas pelas gestantes. “É importante que as gestantes mantenham o acompanhamento e as consultas de pré-natal, com a realização de todos os exames recomendados pelo médico. O Ministério da Saúde reforça ainda a orientação de não consumirem bebidas alcoólicas ou qualquer outro tipo de drogas, não utilizar medicamentos sem orientação médica e evitar contato com pessoas com febre ou infecções. É importante também que as gestantes adotem medidas que possam reduzir a presença de mosquitos transmissores de doença, com a eliminação de criadouros, e proteger-se da exposição de mosquitos, como manter portas e janelas fechadas ou teladas, usar calça e camisa de manga comprida e utilizar repelentes permitidos para gestantes”, alertou o órgão.
O QUE É MICROCEFALIA?
Alfredo Passalacqua explica que microcefalia é uma má formação do sistema nervoso central em que o aumento do cérebro não acompanharia o aumento dos outros órgãos. Nesse caso, a criança teria um cérebro menor do que o cérebro de uma criança dita normal. Isso porque durante o crescimento dos órgãos, o cérebro cresceria menos do que o valor normal.
A microcefalia influencia no desenvolvimento. Ele explica que, em alguns casos, a influência é maior, em outros menor. Entre as possíveis consequências, o médico cita déficit neurológico, a parte intelectual, a possibilidade de a criança ter crise convulsiva. “O desenvolvimento da criança será mais lento. Precisa de uma equipe multidisciplinar, com fonoaudiólogo, neurologista, fisioterapeuta, pediatra”, informa.
Mas o médico acrescenta que a criança pode sobreviver e ter qualidade de vida dentro de suas limitações.
COMBATE AO MOSQUITO
Embora muito pequeno, o Aedes aegypti tem causado vários danos. A dificuldade no combate ao mosquito aumenta, quando considerados alguns fatores, a falta d’água em muitos pontos e a necessidade de armazenamento de água é um deles. Por isso, o médico alerta para a necessidade de intensificar o combate ao Aedes aegypti. Entre eles, fazer a diluição de algumas gotas de hipoclorito – água sanitária – na caixa d’água para matar a larva. Manter as caixas d’água fechadas, evitar pneus com focos de água.
O combate deve ser feito com a ajuda de todos, pois existem desafios. “Você tem casas abandonadas, locais com terrenos baldios, casas fechadas onde, provavelmente, há focos de água que servem de criadouro e o inseto não fica ali. Ele tem uma autonomia de voo. Ele vai para outros locais”, reforça o alerta.

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