Desde o início da guerra na Ucrânia, no dia 24 de fevereiro, oito navios da marinha da Rússia foram destruídos e outros três foram danificados, segundo o site holandês Oryx, que usa inteligência de código aberto para monitorar o desempenho de exércitos de todo o mundo. Entre esses números, que analistas militares consideram relevantes, destaca-se o afundamento do Moskva, nau capitânia da frota do Mar Negro. Esses reveses impactaram significativamente no desempenho das forças armadas russas no conflito, levaram a uma troca no comando da marinha e comprometeram o projeto do presidente Vladimir Putin de estabelecer na Crimeia, anexada em 2014, uma base segura para seus navios de guerra.
O Moskva era considerado o maior orgulho da frota russa e afundou no dia 14 de abril. Embora Moscou diga que ele foi atingido por um incêndio que chegou ao depósito de munições, serviços de inteligência ocidentais confirmam a alegação de Kiev de que mísseis de cruzeiro disparados pelas forças ucranianas foram responsáveis pelo afundamento da embarcação.
Foi a maior perda naval de qualquer marinha em todo o mundo em 40 anos, desde que a argentina perdeu o cruzador General Belgrano na Guerra das Malvinas em 1982. E, à época, representou a primeira grande derrota da Rússia na guerra ainda em curso na Europa.
“Isso levanta questões sobre a competência naval dez anos depois que Putin anunciou que iria restaurar as capacidades, o moral e o profissionalismo da marinha”, disse à rede CNN o ex-capitão da Marinha dos EUA Carl Schuster. “Parece que ele não foi capaz de manter nenhuma de suas promessas para nenhum dos serviços militares da Rússia”.
Um dos efeitos da perda do Moskva foi a mudança no comando da frota do Mar Negro, oficializada no dia 19 de agosto. O vice-almirante Viktor Sokolov assumiu a função antes ocupada por Igor Osipov, segundo a rede Radio Free Europe (RFE).
“Má preparação, aparente descuido e uma atitude geral de indiferença da Frota do Mar Negro provavelmente levaram à demissão” do almirante, disse ao site Politico Michael Kofman, diretor do Programa de Estudos da Rússia do think tank norte-americano CNA.
Embora Osipov tenha permanecido no cargo depois do afundamento do Moskva, ele não resistiu a uma série de ataques ucranianos à frota russa na Crimeia, que danificou sobretudo jatos da marinha ali posicionados e comprometeu o desempenho da frota do Mar Negro em suas missões aéreas.
Foram dois ataques ucranianos à base em Sevastopol, ambos realizados por drones. O primeiro, no final de julho, resultou na destruição de seis aviões e levou ao cancelamento das comemorações do Dia da Marinha. O segundo, três semanas depois, atingiu o mesmo prédio, embora não haja relato de jatos destruídos, segundo o jornal independente The Moscow Times.
A situação ainda piorou. De acordo com uma autoridade ocidental ouvida pela agência Reuters, cuja identidade não foi revelada, mais da metade da aviação de combate da frota do Mar Negro ficou inoperante devido a explosões ocorridas na base de Saky, na Crimeia, em agosto. Ele afirmou que a situação causou um “um efeito psicológico significativo na liderança russa” e que a frota agora é meramente “uma flotilha de defesa costeira” .
O prejuízo na Crimeia foi tamanho que, no início desta semana, a inteligência britânica informou que a marinha russa optou por retirar de lá alguns de seus submarinos, deslocados para o sul da Rússia. Devido ao aumento do poder de fogo da Ucrânia, graças ao armamento fornecido pelas nações ocidentais, Moscou constatou que a posição deixou de ser segura.
“Isso é altamente provável devido à recente mudança no nível de ameaça à segurança local diante do aumento da capacidade de ataque de longo alcance ucraniano. Nos últimos dois meses, o quartel general da frota e seu principal aeródromo naval foram atacados”, afirmou o Ministério da Defesa do Reino Unido em sua conta oficial no Twitter.
A decisão colocou em xeque um dos principais motivos que levaram Putin a anexar a Crimeia há oito anos, que era a criação de uma base segura para a frota do Mar Negro. “A segurança da base agora foi diretamente prejudicada pela contínua agressão da Rússia contra a Ucrânia”, diz o comunicado, sugerindo que a guerra reverteu o que antes era uma conquista russa.
As derrotas da marinha russa somam-se a outros problemas que o Kremlin enfrenta para manter suas tropas ativas e efetivas na Ucrânia. Entre eles, a falta de soldados, devido a mortes e à decisão de Putin de não realizar uma mobilização nacional. Também a redução do arsenal, afetado pelas sanções ocidentais que impedem a Rússia de obter itens tecnológicos cruciais para a produção de armas como mísseis de precisão. Sem falar na disposição dos EUA e seus aliados de continuar armando Kiev, cujo alcance crescente de suas armas tende a gerar prejuízos ainda maiores às forças armadas russas.
Num cenário mais amplo, os reveses da marinha podem comprometer toda a campanha na Ucrânia, de acordo com o analista militar independente Pavel Luzin. “Com a perda do Moskva, de centenas de fuzileiros navais e de vários outros navios, a frota provavelmente não tem mais poder de combate para apoiar a expulsão total da Ucrânia do Mar Negro”, disse ele.
Somando a isso o recente sucesso da contraofensiva que levou Kiev a reconquistar milhares de quilômetros quadrados de território, a balança da guerra nunca pendeu tanto para o lado ucraniano desde o dia 24 de fevereiro.
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