Foto: Adriano Abreu
O Rio Grande do Norte registrou um aumento de bloqueios judiciais entre setembro e agosto em relação aos outros meses. Tendo uma média de bloqueios mensais de R$ 50 milhões para diversas áreas dos serviços públicos, o número saltou para R$ 75 milhões em agosto e até o último dia 18 de setembro já atinge a marca de R$ 50 milhões, chegando a cerca de R$ 125 milhões em 50 dias, segundo dados da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz-RN). Só na Saúde, que representa cerca de 70% da média dos bloqueios no Estado, foram cerca de R$ 15 milhões bloqueados em ações coletivas para diferentes áreas da saúde pública potiguar neste período.
O mais recente caso foi o bloqueio de R$ 2,1 milhões das contas do Estado para a realização de cirurgias urológicas contando com uma lista de 266 pacientes no aguardo de procedimentos. Destes, 48 foram considerados prioritários que necessitam urgentemente de cirurgia a partir de riscos graves, como perda dos rins e necessidade de hemodiálise, pedido feito pelo Ministério Público do RN e Defensoria Pública do Estado.
Antes, a Secretaria de Estado da Saúde Pública do RN (Sesap) já havia sofrido com outros dois bloqueios consideráveis em duas questões que historicamente ganham destaque: o Hospital Estadual Walfredo Gurgel e a Unidade Central de Agentes Terapêuticos (Unicat-RN), com bloqueios da ordem de R$ 8,2 milhões e R$ 4,7 milhões, respectivamente.
Os sucessivos bloqueios nas contas do Estado têm preocupado o secretário estadual de Fazenda do RN, Carlos Eduardo Xavier. Na avaliação dele, os bloqueios judiciais, embora sejam para garantia de acesso a serviços, acabam por afetar o planejamento das secretarias, gerando um outro problema na organização financeira das pastas. Ele cita ainda que alguns dos alvos de “são de competência de outros entes e acaba-se bloqueando recursos do Estado”.
“Estamos muito preocupados. Claro que esses bloqueios, a maioria deles, são de pessoas que buscam assistência de saúde que é o caso da maioria, mas tem também RPVs (Requisições de Pequeno Valor) que são bloqueios realizados por ações de servidores. Qual o problema: esses bloqueios resolvem situações pontuais mas criam problemas em outras áreas, porque junto com o bloqueio não vem o recurso, vem a obrigação de pagar e esse recurso vai acabar faltando em outro lugar. Acaba sendo uma judicialização da gestão saúde pública do Estado. A Justiça tem o olhar do caso concreto, mas não tem a visão do todo. Esses bloqueios aparecem na conta pela manhã e acabam gerando uma imprevisibilidade muito grande na gestão das contas do Estado”, acrescenta.
O titular da Sefaz-RN cita ainda outra questão, em que os valores bloqueados “em regra” são para prestação de serviços cujos valores são mais altos do que se fossem prestados na rede pública. O gestor da fazenda estadual disse ainda temer novos bloqueios.
“É muito sensível, como esse caso da urologia agora, a gente entende que as pessoas estão precisando, mas o que me preocupa é que essa forma de resolver os problemas através de bloqueios pode gerar um caos ainda maior. Resolve um problema específico mas aquele dinheiro que foi bloqueado poderia ser utilizado em outra área até da saúde mesmo. Para além disso ainda tem a discussão mais plausível é que esse custo, principalmente na área da saúde, em regra o valor do serviço é sempre mais alto se o serviço fosse prestado pelo SUS”, acrescenta.
Ele cita ser necessário um “diagnóstico maior” acerca da situação do Estado, mas aponta que a queda na arrecadação de ICMS pode ser um dos fatores que expliquem os aumentos dos bloqueios.
“Precisamos de um diagnóstico maior para saber porque esses bloqueios estão se avolumando nos últimos dois meses e ainda não temos um diagnóstico do que está acontecendo. De julho para agosto e de agosto para setembro o aumento nos bloqueios foi de 50% por mês. O que eu reconheço é que a gestão financeira do Estado em 2024 tornou-se muito mais complexa pela redução da alíquota de ICMS e a arrecadação vem caindo mês a mês e isso traz, claro, dificuldade na gestão financeira do Estado”, finaliza.
Sesap recorre de bloqueios judiciais
Em relação aos bloqueios feitos em ações coletivas, a Secretaria de Estado da Saúde Pública do Rio Grande do Norte recorreu dos três casos e alega que os bloqueios ora não é uma medida suficiente para sanar os problemas, ora que o valor bloqueado é acima do valor o qual a pasta está autorizada a pagar por procedimento.
Com R$ 2,1 milhões bloqueados para cirurgias urológicas, o MP e Defensoria Pública alegaram que havia uma lista de espera com 266 pacientes, sendo 48 deles com risco iminente da perda do rim.
A ação civil pública alegou que o Hospital Coronel Pedro Germano (Hospital da PM) e o Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL) estão funcionando no limite de suas capacidades, e há uma necessidade urgente de medidas para garantir a realização das cirurgias. O Hospital Rio Grande foi indicado como o prestador de serviços responsável pela execução dos procedimentos cirúrgicos, devido à sua capacidade instalada para realizar as operações.
A Sesap, por sua vez, recorreu, alegando que “dano ao erário, visto que o valor apresentado pelo Ministério Público por cada procedimento é quase três vezes superior ao preço do qual a Sesap dispõe em sua tabela, aprovada pelo Conselho Estadual de Saúde, para a contratação do serviço complementar em unidades privadas”.
“Com a contestação judicial, a Sesap pretende assim ampliar o número de pessoas atendidas com o recurso que foi bloqueado para muito além da lista apresentada inicialmente. A Sesap ressalta ainda que, desde 2019, trabalha na qualificação da linha de cuidado da urologia, tendo instalado o serviço de implantação de catéter no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, com média de 60 procedimentos por mês, e o de segunda cirurgia no Hospital Central Coronel Pedro Germano (Hospital da PM), que realiza 40 cirurgias/mês. Ainda com relação à ação, a Sesap destaca que havia uma reunião marcada com o Ministério Público para aquela mesma segunda-feira (16), dia em que a decisão de bloqueio foi publicizada, com objetivo de discutir a proposta de ampliação da linha de cuidado com a contratação de serviços privados para a realização das cirurgias e a participação dos municípios no financiamento dos procedimentos, visto que é uma política pública onde o SUS determina a divisão entre os entes”, alegou a pasta.
No caso do Walfredo Gurgel, a decisão judicial do dia 13 de agosto determinou o bloqueio de R$ 8,2 milhões para o abastecimento de medicamentos, insumos e material médico cirúrgico. O valor também se destinava ao pagamento de dívidas de 2022 e 2023 junto a fornecedores.
O MP chegou a citar no seu pedido que o orçamento requerido pelo hospital à Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap) para a compra dos itens mencionados alcançava o valor de R$ 45.498.672,37, quantia que, se dividida em 12 parcelas ao ano, daria uma média de R$ 3.791.556,031 mensal. O montante ainda inclui despesas com a manutenção dos contratos vigentes. No entanto, desde a abertura do orçamento de 2024, foi repassada a unidade de saúde somente a quantia de R$ 6.633.585,27 para o período de janeiro a maio do corrente ano. O valor é insuficiente uma vez que os dados da unidade demonstram que as contas chegam a R$ 18.957.780,16.
A pasta, por sua vez, rechaçou a ação do MP e disse que recorreu da decisão em virtude de “informações desatualizadas que basearam a medida”.
“Com relação a dívidas relativas aos anos de 2022 e 2023 do hospital, a pasta disse que o Governo do Estado repassou todos os recursos para quitação dos valores listados. E sobre os repasses feitos para custeio, a unidade tinha recebido até então um valor superior a R$ 24 milhões, bem acima do que foi listado na decisão judicial de bloqueio”, disse a pasta.
A respeito da Unicat, a Sesap disse que “como é sabido pelas instituições envolvidas no processo, que apenas o bloqueio de recursos não é medida suficiente para a aquisição de medicamentos, visto que inúmeros processos conduzidos pela Sesap e pela Unicat, que trabalham em regime de força-tarefa permanente, não recebem propostas de empresas, outros com valores acima do tabelado e autorizado para a compra, bem com parte das empresas também passa por problemas de abastecimento de seus estoques e não conseguem cumprir o prazo para a entrega dos insumos”, finaliza.
Tribuana do Norte
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