O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria de votos nesta sexta-feira (1º) para validar a possibilidade de cobrança de contribuição assistencial destinada a sindicatos de todos os trabalhadores da categoria, mesmo os não sindicalizados.
Essa cobrança precisa ser aprovada em acordo ou convenção coletivos. De acordo com a posição da maioria dos ministros, trabalhadores podem ter o direito de se opor ao pagamento dessa contribuição, formalizando que não querem ter esse desconto no salário.
A votação estava paralisada desde 21 de abril, quando o ministro Alexandre de Moraes pediu vista do processo.
A Corte julga o recurso de entidades sindicais contra a decisão que determinou a obrigação apenas de funcionários filiados ao sindicato da categoria. Especialistas consultados pela CNN apontam que a possibilidade de cobrança compulsória pode acarretar insegurança jurídica e representa um retrocesso.
A advogada trabalhista Yuri Nabeshima indica que idealmente a discussão sobre a obrigatoriedade da contribuição deveria ser realizada no Congresso Nacional, e não por via judicial.
“É pouco seguro que a obrigatoriedade venha por decisão judicial — ainda que do STF. Esse assunto [contribuição a sindicatos] precisaria ser tratado de maneira mais sistêmica, com uma análise sobre o custeio das entidades. E essa análise sistêmica tem que ser feita no Congresso.”
Desde que a reforma trabalhista deu fim à obrigatoriedade da contribuição sindical, diversos setores, partidos e figuras políticas — inclusive o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — apontam o suposto enfraquecimento dessas entidades.
Com isso, o debate permanece intenso entre defensores e opositores dos impactos acarretados pela reforma ao custeio dos sindicatos. Para a advogada, apesar de pontuar que matéria deveria ir ao Congresso, o STF toma uma “atitude louvável” ao buscar o “equilíbrio de forças”.
Já para o advogado trabalhista Luiz Fernando Plens de Quevedo, o retorno da cobrança sindical será um retrocesso e um movimento contrário ao princípio da liberdade sindical — medida que garante o direito de fundar e filiar-se ao sindicato ou organização de predileção do indivíduo.
Mudança pode gerar insegurança jurídica
Até o momento, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, e o relator Gilmar Mendes defenderam a obrigatoriedade e levaram o placar a 3 a 0. Apesar de reconhecer a constitucionalidade da cobrança a não filiados, o entendimento apoiado pelos ministros garante aos trabalhadores o “direito de oposição”.
Quevedo explica que — caso a Corte feche a maioria pela obrigatoriedade — “ao trabalhador ainda será possível opor-se ao pagamento, de forma individual, por meio de carta apresentada ao sindicato representativo da sua categoria econômica”.
Na avaliação de Ronan Leal Caldeira, do GVM Advogados, tal disposição “cria retrocesso e insegurança jurídica, levando trabalhadores não filiados a terem maior dificuldade para expressar sua contrariedade com a cobrança e, assim, evitar o desconto em folha de pagamento”.
Yuri Nabeshima também reitera que a regra pode criar insegurança jurídica. Ela aponta que são recorrentes às empresas dúvidas quanto à obrigatoriedade ou não do pagamento dessas taxas. Segundo a advogada, as mudanças recorrentes pioram o cenário.
“Muitas das empresas não têm acesso a uma consultoria jurídica. Com essa mudança de entendimento, a empresa tem que estar ciente das alterações, mudar o procedimento para passar a fazer esse desconto e ainda conscientizar o trabalhador de que ele pode fazer oposição à medida”, aponta.
Cássia Pizzoti, do escritório Demarest Advogados, discorda de que a mudança causaria um retrocesso. Segundo ela, o efeito seria o fortalecimento da representação sindical, com “amadurecimento do conceito por trás da reforma trabalhista”.
“Em relação às empresas, elas devem ter maior segurança jurídica, já que isso evitará conflitos que decorrem naturalmente de tema tão controverso como esse. Sob o ponto de vista financeiro, não há impacto às empresas, já que se trata de contribuição imposta à categoria profissional”, argumenta.
Entenda o caso
Vale destacar que a contribuição assistencial é diferente da contribuição sindical — que era obrigatória a todos os trabalhadores e empresas, mas se tornou opcional em 2017, com a reforma trabalhista. O Supremo validou esse dispositivo da reforma em 2018.
O julgamento sobre a contribuição assistencial data de antes da reforma trabalhista e tem repercussão geral. Em 2017, a Corte havia definido, com voto do relator Gilmar Mendes, que a cobrança da contribuição assistencial de não sindicalizados era inconstitucional.
Após interposição de embargo de declaração, o ministro Luís Roberto Barroso pediu vista no processo. Quando a pauta retornou ao plenário, Mendes mudou seu entendimento em relação ao voto de 2017 e incorporou o voto de Barroso.
“Havendo real perigo de enfraquecimento do sistema sindical como um todo, entendo que a mudança de tais premissas e a realidade fática constatada a partir de tais alterações normativas acabam por demonstrar a necessidade de evolução do entendimento anteriormente firmado por esta Corte sobre a matéria, de forma a alinhá-lo com os ditames da Constituição Federal”, afirmou Mendes em seu voto.
O entendimento anterior do STF foi proferido antes da reforma trabalhista, quando ainda era obrigatória a contribuição sindical, observa Cássia Pizzoti.
“Com o decurso do tempo, os efeitos da reforma trabalhista apareceram, por isso não é estranho que um entendimento inicialmente consolidado mude com o amadurecimento do debate diante da mudança de cenário”, completa.
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